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os loucos não errarão o caminho

Quero ter alguém com quem conversar. Alguém que depois não use o que eu disse contra mim.
renato russo
Calma é a face do meu mar, mas esconde monstros impiedosos.
Nietzsche
Você fica pilhada quando eu erro. Mas eu não erro. Eu não erro. Eu uso tons dissonantes.
Paulo Dagomé

então, tudo bem. se não há outro jeito, vamos lá.
meu signo, meu gen e minha formação no mais das vezes impedem-me de revelar às pessoas aquilo que realmente penso. a face lívida esconde monstros. torço-me atrás da máscara de bom moço. minha simpatia oculta análises frias e calculistas. (nem sempre corretas)
e é-me difícil dizer coisas como as que direi a seguir: durante muitos anos pensei uma revolução particular quando ainda clarinetista na congregação cristã no brasil e, depois, quando me evadi dela, ainda construía modelos de reforma da sociedade de um modo singular até à concepção do que viria a ser os “radicais livres”, idéia que surgiu numa noite de lua cheia, a partir de uma leitura que eu fiz sentado no vaso do banheiro da casa que hoje chamamos de senzala, sobre o movimento armorial, sendo que o possível grupo, a quem chamei inicialmente de ‘a ordem dos templários’ seria um híbrido de capitalismo e socialismo, como se a rede mcdonalds vendesse comida natural com a mesma voracidade. os sujeitos que foram agregando-se a esta idéia inicial não comungavam propriamente com ela, nem ela era tão clara para mim como foi se tornando depois, porém era necessário realizar alguma mudança no cenário cultural de são sebastião e não havia tempo pra recrutar um sem número de pessoas e depois fazer uma seleção dos mais adequados ao ofício de ‘ativista cultural sem ranço ideológico muito profundo’. era preciso lutar com os mercenários, os revolucionários, os párias, os bem-nascidos, os viciados, os veados, os amotinados, os perturbados, os insurgentes, as putas, os canalhas, os políticos, os anárquicos, os devassos, os profetas, os poetas, os palhaços... devana babu e célio-mão-de-aço... vinicius borba e saulo dias... hellen cris e sueli... nayara e hellen afro... claudia bullos e máximo que ainda não era mansur... carla bianca e thiago alexander... júlio césar e david patrick... pra isso minha simpatia servia muito bem. e eu a usei. até este momento eu a usei. depois deste momento não se poderei.
***
éramos joões-ninguém. éramos zé-manés. éramos os figurantes nas filas intermináveis esperando o 147.3 na rodoviária do plano piloto, que nunca estaria vazio, pra voltar pra maldita e empoeirada cidade-dormitório, descansar algumas horas e voltar pro batente no dia seguinte, com um lencinho pra limpar o assento cheio de poeira, de cara amarrada, batendo a cabeça no vidro da janela do ônibus porque o sono da noite anterior não fora suficiente, já que são seis horas da manhã e tem muita faxina e jardinagem pra fazer nas modestas casas do lago sul.

***
depois era o sarauradical e aquela alegria insana.
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élio júnio foi pra faculdade. hellen foi pra faculdade. borba foi pra faculdade. julio foi duas vezes pra faculdade. dagomé foi pra faculdade. naiara foi pra faculdade. élson foi pra faculdade. diogo foi pra faculdade. sueli terminou a faculdade. carla foi pra faculdade. cris foi pra faculdade. saulo foi pra faculdade. john montou um negócio. isaac virou professor. binho virou professor. devana virou escritor. surica virou compositor. dagomé virou gerente de cultura...
***
viramos protagonistas sem saber que isso estava acontecendo. esse protagonismo gerou ascensões sociais que, se não geram mudanças profundas no desenrolar da revolução, vai determinando uma “evolução” social qual medidor da qualidade e da velocidade do processo. sendo os caçulas do terceiro setor em são sebastião, acredito que estamos na vanguarda das realizações na cidade. tenho muitas dificuldades de separar o que é feito pelos radicais do que é feito pela gerencia talvez em virtude da mistura que falei anteriormente entre o capital e o social. o radical livre, com raras exceções, não tem preparo intelectual, ideológico ou mesmo ético para fazer as devidas separações entre o público e o privado, entre o capital e o social porque neles estas coisas se misturam pelo simples fato de que para eles “é tudo nosso!!!!”.
o estado é nosso. a administração é nossa. a cidade é nossa. nós somos os donos das coisas e, aos poucos, estamos nos apropriando daquilo que durante muito tempo disseram que não nos pertencia. só que isso é um processo. não começou ontem e não vai terminar amanhã. temos uma meta utópica de alcançar a estrela. nosso objetivo é dominar o mundo e começamos por são sebastião, mas temos consciência de que só os nossos tataranetos o farão na sua integridade e não nos importamos com isso. o fato de já termos consciência de que o mundo nos pertence e de que nos utilizaremos do próprio sistema para dominá-lo é-nos suficiente. e temos consciência de que quando depusermos o último dos oligarcas faremos uma eleição para o cargo de gerente da revolução.
é uma besteira ficar nesse trololó ideológico interminável. pra nós interessa a vida. a participação na vida. a intervenção na vida. cantar, interpretar, declamar, gritar. causar polêmica. provocar o choro. arrancar gargalhadas. nós não viemos para trazer a paz e sim a espada. se lasquem, doidos. quem conosco não ajunta, espada. porém, amigo meu comeu, eu tô gozando. se isso é à esquerda, melhor ainda. se tem ranços marxistas, que ótimo. se tem semelhanças com o velho petismo, que massa. se envolve a comunidade, estamos felizes. Se é ético, responsável, ecológica e politicamente correto, que magavilha. se é possível envernizar nosso trabalho com teorias oriundas da verve daniélica no que tange à revolução utópica que ele carrega em si como fruto da sua formação marxista, não queremos outro presidente. Amo muito tudo isso. mas nós não temos tempo pra muita discussão, não! temos muito que fazer. temos mais o que fazer. neste momento em que escrevo julio césar, ede.c, surica, borba e diogo estão numa reunião com a diretora de uma das nossas escolas públicas para tomar conta - a convite expresso da diretora para os radicais livres - do projeto da escola integral que será implantando lá. nós não tivemos tempo para nos perguntar se foi o arruda ou o lula ou o caudilho que inventaram esse negócio de escola integral. nós só sabemos que tem uns meninos que receberão oficinas culturais no horário contrario às aulas e a gente acha que isso é bom pra eles e a gente vai lá e faz aquilo que acordamos. nem sabemos se fazemos direito. no processo a gente descobre e “correge”
enquanto isso, são três da tarde, o mão-de-aço tá consertando a aparelhagem de som pra um evento de rock que vamos fazer numa escola e devana babu e luiz próton estão fazendo uns desenhos toscos sobre um olho que sai do corpo do cara, ganha vida própria e sai espalhando discórnea, digo discórdia por aí... a bia e a priscila estão gravando, numa aparelhagem ruim dos infernos, uma música da carla, com uns arranjos do maestro tiago, pra colocar num festival de música de uma instituição dominada por petistas, enquanto um forrozeiro chamado carlinhos brown, vocalista de uma banda chamada arrasta gatinha veio pedir o som da gente emprestado pra fazer um evento chamado forró solidário pra arrecadar alimentos pra uma creche que a gente nem sabe se é idônea ou não... velhos, fodam-se marx e engels! fodam-se weber e hegel! se lasquem aristóteles e platão. morram kierkgaard e jung. ao inferno com plotino. morram todos que estão todos mortos. temos mais o que fazer. temos mais o que viver. se em cada cidade satélite de brasília houvesse um grupo que produzisse arte e revolução, ainda que inconsciente, como os radicais livres fazem, estávamos feitos. oxalá em cada administração regional houvesse um radical livre infernizando com sua capacidade e seu talento (que nós somos capazes e talentosos e, de quebra, somos bonitos) a morosidade letárgica do poder. temos nosso próprio equipamento de som. pagamos em dia o aluguel da nossa sede. temos nossa bateria. temos nossos cubos de baixo e guitarra. temos nossos instrumentos musicais. temos pelo menos cinco bandas no grupo. temos um grupo de teatro. temos um arte finalista próprio. temos artistas plásticos, poetas, declamadores, compositores, cronistas, romancistas, desenhistas, dançarinos, teatrólogos, todos nós jogamos xadrez, todos lemos bastante, temos blogs com um belo acervo, temos empreendedores, vários tocam instrumentos musicais, temos um vocabulário vasto, somos reconhecidos como vanguarda cultural em todo o distrito federal, temos um especialista em direitos da criança e do adolescente, ganhamos vários festivais, temos uma ong que é oscip, nossos filhos crescem ouvindo poesia, dançamos a dança do creu recitando pessoa, tocamos bateria por partitura, temos uma ala na escola de samba, temos quarenta aprendendo basquete, temos quarenta aprendendo xadrez, temos trinta aprendendo teatro, temos vinte aprendendo dança de salão, temos quarenta na iniciação musical, temos vinte na aula de violão. temos doze no vôlei. temos dois fanzines. nosso computador é fruto de um prêmio. somos atrações da feira do livro. estamos à beira de ganhar um terreno de dois mil metros quadrados pra construir nossa sede e fizemos o gerente de cultura da nossa cidade.
a cada festa que fazemos, por mais que ela não tenha o cunho educacional necessário e eu também não sei se festa tem que ter cunho educacional, uma dezena de pessoas é beneficiada pela chamada economia da cultura. um sem número de mototáxis – coisa mais periférica não existe. lindas barraquinhas de churrasquinho de gato. maravilhosos empresários do ramo cervejeiro com suas higiênicas caixas de isopor. veículos altamente higiênicos vendendo o nacionalíssimo hot-dog. dançarinos altamente performáticos. músicos que recusaram convite da orquestra sinfônica por amor à noite. dj’s e suas variadas versões da dança do créu. donos de equipamentos de som. arte-finalistas. profissionais gráficos. proprietários de carros de som. locutores emproados. motoristas de táxi embasbacados. vagabundos profissionais apelidados de promoter. mascates do corpo alheio. garotos de programa. caixeiros não viajantes. balconistas. roubadores de almas, mais conhecidos como fotógrafos. cinegrafistas sonolentos. barmans entediados. garçons empertigados. vendedores de bombons de qualidade discutível. comerciantes de canabis. coladores de cartaz nas madrugadas sombrias. panfleteiros nas tardes silenciosas. emproados donos de casas de shows. sovinas vendedores de caipifruta. escusos mercadores de pó. truculentos seguranças. cambistas éticos. senhoras profissionais da noite. refinados guardadores de carros. a clássica vendedora de flores. e quando tudo acaba certos mercantes já retiraram todos os recipientes que outrora continham o aurífero líquido a que denominamos cerveja e o campo está limpo para que, de manhãzinha bem cedo, os garis venham e façam a parte que lhes cabe neste latifúndio. pra isso servem as festas. alegram a alma e mantêm famílias. mais do que tudo, nós, radicais, somos felizes. nós somos felizes. não temos quase nada e somos felizes. não temos carros e somos felizes. temos moradias precárias e somos felizes. temos uma cidade pobre (em mutação) e somos felizes. temos uma vida espartana e o pensamento ateniense e somos felizes. somos felizes no nosso sarau. somos felizes porque o carnafamília é nosso. porque o festival de inverno é nosso. porque a festa da cidade é nossa. porque o administrador da cidade é nosso. porque fizemos um deputado. porque viramos o jogo político como cidades maiores e mais conscientes não fizeram. porque a maioria das pessoas que trabalham na administração regional são da nossa cidade como não era no passado. quando comecei na administração, a primeira coisa que pensamos foi num fórum de cultura, que deu origem ao conselho regional de cultura e apoiamos desde o primeiro momento a formação da associação de artistas de são sebastião. entreguei na mão dos esportistas da cidade, em reunião bastante representativa, um estatuto para que estudassem a formação do conselho regional de esportes, já com um modelo de regimento interno. estamos preparando o estatuto do conselho de ação social que será formado em breve e para isso convidamos o pessoal que cursa ação social nas faculdades virtuais de são sebastião. chamamos a asass, associação de artistas, da qual somos sócios fundadores, para gerenciar a festa da cidade. chamamos a organização costa leste, formada por rapers, a qual ajudamos a criar, para cuidar dos eventos de hip hop. chamamos o pessoal do basquete para interferir nas ações do segmento e assim fizemos com cada um deles. futebol, vôlei, atletismo, xadrez, gospel, católicos, quadrilhas juninas, artesanato... abrimos uma sala, ao lado da sala da divisão de cultura, para uso dos conselhos, com computador, telefone, impressora, xérox, mesas, cadeiras e uma secretária, funcionária da divisão de cultura, disponibilizada para tal métier. tentamos contribuir com cada segmento sem nos intrometermos nas especificidades de cada um. se esse pessoal não se apodera dos instrumentos que colocamos em suas mãos para fazer a revolução necessária, a exemplo do que fazem os radicais livres de são sebastião distrito federal brasil américa do sul planeta terra via láctea sistema solar universo fodam-se todos. se lasquem, doidos. nós estamos fazendo o que achamos que temos de fazer. por nós e por outrem. não querem entrar na dança, vão dançar. querem ficar nas intermináveis reuniões marcadas para definir o dia e o horário da próxima reunião, morram filhos de uma puta. e quando digo tentamos, fazemos ou pensamos não estou tentando ser modesto. estou falando de nós, radicais livres, a quem consulto com freqüência, principalmente os com quem mais convivo, com deferência especial a julio césar, george gregori e diego suricate. fizemos bons eventos e boas oficinas. longe do ideal que pulula em nossa cabeça, é verdade. mas, mais longe ainda do marasmo cultural em que vivia essa bendita cidade antes que existíssemos nela como agentes de cultura. na noite de ontem dez adolescentes da nossa oficina de teatro foram a um dos mais consagrados saraus do distrito federal e fizeram bonito declamando poesia e encenando. na noite de hoje sete radicais, entre eles mão-de-aço, estarão fazendo um curso de cinema. na noite de hoje doze garotas foram à brazlandia, num carro da administração regional o qual estão usando há uma semana e ganharam a partida que lhes deu o direito de disputar a semifinal de um campeonato tradicional. estão há uma semana usando esse carro. vão trazer o troféu nesse carro. que não é da administração. é deles. ora, dirão, o que isso tem a ver com a gerencia de cultura. ora, direi: tudo. é tudo nosso.
muitas dessa “conquistas” podem ser ilusões. mas temos a ilusão de que há um avanço qualquer e que os radicais livres e o gerente de cultura têm uma participação efetiva, objetiva, medível, ímpar, nessa mudança. contamos para isso com vários maravilhosos “burgueses” a quem deixamos de odiar e de considerar os únicos responsáveis por nossa desgraça: daniel, andré, beth, élber, claudia, cláudio, outros... muito do que “conquistamos” é fruto do meu “maquiavelismo nobre”. minto, engano, desfalco, pilho, subverto, torço, desvio, roubo, achaco, trapaceio, mordo, implico, trucido, futuco, pinico, espeto, aperto, jogo, subjugo, compro, massacro, influo, inverto, pirateio, rapino, fraudo, coopto e acredito que um dia matarei pelos ideais de revolução atípica dos radicais livres. não paro. não paro. não paro. vou ser secretário de cultura do distrito federal e só não serei ministro por que não vai dar tempo. estarei compactuando com o poder para que algumas coisas sejam feitas para o populacho. não vou brigar com golias. vou aproveitar os momentos em que ele cochilar e roubar comida pros habitantes do vilarejo. não tenho forças ou recursos pra essa luta ideológica na qual não acredito como essencial pra quem tem fome de alma. não é possível derrotar o “inimigo” com as fracas forças que tenho. vou puxar o saco de nero e roubar um cacho de uvas pra matar a fome da minha família e, quem sabe, um dia, no futuro, eu reúna o dinheiro suficiente pra pagar um mercenário para assassiná-lo. nesse dia eu não vacilarei um minuto. mas esse dia não é hoje. eu não tenho medo. eu perdi o respeito. eu pus o pé no caminho. tem uns caras que tão indo na frente com umas lamparinas velhas e roubadas pra identificar o caminho. tens uns caras que tão subornando uns guardas na retaguarda pra retardar seu passo. e é só. o resto é a história que a gente ainda vai construir. nela estará escrito que um bando de loucos se reuniu pra fazer teatro poesia e música e descobriram que dá pra ser politico e poeta. ator e empresário. músico e estadista. compositor e oficineiro. baterista e professor. cronista e químico. dona de casa e promoter. artista plástico e diretor de cultura. eletricista e sonoplasta. revolucionário e empreendedor. eu sei que parece loucura. mas os loucos não errarão o caminho...

1 comentários:

d.b disse...

os loucos não errarão o caminho!